Tu e eu – isto, sob o sol imperturbável,As noites mais longas, os dias mais inúteis,
E mais nada, só isto, sem elegia,
Tudo lentamente engolido pelo passado
E, sob a leve película da memória,
Quando mais se diria de água,
Afundam-se contornos indistintos, esbracejando,
Tu e eu, enquanto nos habituamos
À nossa condição de náufragos – e afogados.
O amor foi como uma carta,
Igualmente frágil, amarrotado,
Extraviado, deixa o desespero
À cabeceira do fim, que está atrasado,
Se demora, talvez nunca chegue.
Há afinal tanta coisa que não acaba,
Tantas cartas que se continuam a escrever
Muito depois de a mão ter detido
O seu percurso, muito depois de o campo
Estar lavrado, queimado por geada –
Há afinal o próprio amor que não acaba
E murmura tanta coisa que não é sequer memória.
Dirás: viveste afinal quando
Tínhamos prometido morrer?
Não faltei, perjuro, à minha morte,
Esteve sempre contigo.
Que fará de nós o absurdo orgulho
De alta escola, o que de nós
O amor irreparável?
Nuno Rocha Morais