sábado, 26 de outubro de 2019











Tenho mais isto e mais aquilo
E não sei quê para fazer.
O feito é fio por fiar.
Com ele ao ombro, ando intranquilo,
Alvo de fogo que é o dever
Que nunca pára de picar.

Mas como tenho que fazer!
Ensarilhado em decidir,
Na encruzilhada do dever
Para que gesto hei-de partir?
Querer fazer é coisa pesada
E à luz do feito não há nada.

As horas descem do seu leito,
Ainda não fiado o feito.

Nuno Rocha Morais

terça-feira, 15 de outubro de 2019

POEMA PARA “ELEGIA PARA A MINHA CAMPA” DE S. DA GAMA


Também eu estarei só,
Até já sem mim,
Não no seio da terra,
Pois que de vida é a terra,
Mas no ventre da morte
E será então que outros
Virão depositar lembranças,
Belas, das que não houve,
Lembranças sinuosas;
Virão depositar pétalas esmaecidas
De pálida e apressada ternura,
Apenas porque estarei só
E estarei morto,
Já frio, já mármore, já morte.

Também eu estarei só,
Apenas rodeado pela atenção
De círios ou rosas,
Vigilantes, tentando ver
E gravar em cor ou chama
A minha subida ou descida,
Se as houver.

Mas ver-me-ão apenas só,
Embora com o mundo todo em torno
Matéria jorrante,
A minha alma será corredor,
Escuro espaço de solidão
E eu estarei só.

E será apenas então,
Eu, que cantei toda a vida,
Que, no silêncio,
A minha voz se espalhará
E se tornará alegria nas coisas,
Pureza de união
Para que a minha voz,
Ao invocar o mundo,
Não mais esteja só.

E apenas eu estarei só,
Só.

Nuno Rocha Morais (Galeria)

domingo, 13 de outubro de 2019

Ring, ring, ring, ring... Catholic bells W.C.W.

(Poema publicado na Gazeta Literária nº5, da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto, dedicada a Daniel Faria)

domingo, 6 de outubro de 2019

O Pintor

Não quer deixar as coisas na tinta
Tal e qual ele as vê,
Tal e qual elas são.

Quer pintá-las como as imagina
Escondidas num essencial silêncio,
Numa virginal impenetrabilidade.

Esbate os contornos das coisas,
Os seus limites, afoga-os
E, de certa forma, ilumina a sua verdade.

A tinta, asas e olhos do pintor.


Nuno Rocha Morais

                                                                                                               

Deram-nos uma liberdade de cravos Desenterrada dos mais sombrios tempos – Crónica da memória – Liberdade pisada, amarfanhada Nas profundezas...