domingo, 23 de julho de 2017

Não, Cristo, não mais sofras por mim,
Não morras mais por mim.
Liberta-te do mármore, da madeira,
Dos silêncios dos templos
Esquecendo que és fruto divino, Cristo, salva-me.
Não mais te deixes crucificar,
Deixa que os homens mesmo se crucifiquem:
Só assim eles aprenderão.
Deixa, Cristo, que nós saibamos mais do que metáfora
Os pregos devorando a carne,
Deixa que ouçamos a alma gritar contra nós
“Porque me abandonaste?”
Deixa que exactamente aprendamos, Cristo
O Gólgota que dentro de nós dorme,
Deixa que as lágrimas devorem os olhos –
A guerra no Monte das Oliveiras,
Deixa, Cristo, que nos reneguem,
Que nos dêem a beber o fel,
Deixa que saibamos o peso da cruz,
O peso das lágrimas de Madalena,
Deixa, Cristo, que aprendamos tudo por nós.
Só assim teremos merecido a alegria da morte.

Nuno Rocha Morais

domingo, 9 de julho de 2017

Em torno do tabuleiro
Quatro jogadores.
O jogo não flutua, alteroso,
É conduzido serenamente
Pela agulha da sorte,
Que percorre as peças
Dos quatro jogadores.
Depois de um gambito,
A Primavera joga a sua dama,
Colocada exactamente no centro:
Xeque-mate
Mas os jogadores sabem
Que todo o xeque-mate
É temporário.

Nuno Rocha Morais

Deram-nos uma liberdade de cravos Desenterrada dos mais sombrios tempos – Crónica da memória – Liberdade pisada, amarfanhada Nas profundezas...