segunda-feira, 5 de setembro de 2022

Para começar sento-me num jardim

À procura de um regresso que não se acha –

Túneis e galerias,

Um pais perdido tão facilmente,

Mais leve do que o pó.

Uma tarde para experimentar por fim

A minha vida,

Aquela que julguei a minha pior inimiga,

A que me roubou tudo quanto amei

E pouco me deixou nas mãos –

Mas agora não vale a pena lutar contra ela

E sorrio-me do absurdo que é sabê-lo,

Talvez mais até do que combatê-la.

É com a minha vida que me sento,

Percebendo o seu relevo lacunar –

Alguém deverá ter dito desta fulguração última

Sobre a qual vai ganhando consistência

Um sono imprestável,

Que se converte em crosta e fundura

E assim se me revela:

De nada serve ou adianta que outrora –

Ontem, apenas – um nome tenha sido amor,

O nome que se vai desmantelando

No movimento vagaroso da tarde.

Seja como for, a conta estará certa.

Para acabar, sento-me num jardim.

Ao levantar-me, serei simplesmente o que começa. 


Nuno Rocha Morais

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