Deixo-me cair. Chove.
A mágoa tenta ser demasiada,
A resignação, voz velha e sábia,
Procura confortar-me
Com todos os exemplos que vai tirando do baú.
As ilusões estouram, o coração pode menos,
Sempre um pouco menos, coberto de goteiras,
É possível que tantas impossibilidades
Acabem por vencer
E façam vingar a sua lei.
Talvez nas veias da tragédia
O sangue seja de farsa chocarreira.
Que, então, tudo se desminta, se deslace,
Que nunca tenhamos merecido
Com lágrimas fundar amor,
Que o ridículo não se apiede de nós.
Uma razão qualquer argumenta
Que um homem também se alimenta de pontapés.
Deixo-me cair, mas, então, ao principio muito longe,
Depois cada vez mais perto,
Com forças maiores e maiores,
Há uma voz que soa límpida
E que pelos caminhos distribui a abundância
Equivoca um “talvez não, talvez não”
Até que em mim há espaço
Para de pé repetir: talvez não, talvez não.
Nuno Rocha Morais
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