sábado, 4 de dezembro de 2021

Mãe

 A mãe dizia-lhe: o que não vires,

Escreve; o que não puderes,

Escreve. O que não escreveres

Será o que realmente viste e pudeste.

Agora sobre o pórfiro do céu,

Recomeça com aquilo que começou,

O barro mais elementar

E o leite mais necessário

Até ao fim – as palavras da mãe,

Agora que todo o outro amor é nada

E se recusa a abrir,

Tantas cidades e partida nenhuma,

Num abandono ainda quente.

Em pensamento, a mãe vem lamber-lhe as feridas,

Depois, talvez fique de novo o voo aflito

Perante demasiado espaço

E por toda a parte se ouça, ardente,

O arco sussurrante de uma voz –

Vem morrer –

Mas, se cair, há-de recomeçar,

Repetindo, repetindo sempre,

A única palavra que o salva: mãe

 Desde o princípio, contra o fim. 

 

Nuno rocha Morais


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