domingo, 12 de julho de 2020

                                           “Porém meu ódio é o melhor de mim”
                                                                  Carlos Drummond de Andrade

Não odiei ninguém, nem mesmo
Quando me enterraram vivo.
Não tem importância,
De nada me servia, embora me pertencesse
A minha vida.
Não perguntei nada,
Lá teriam as suas razões
Para me enterrarem vivo
Aqui, onde tocam telefones
Dia e noite, dia e noite,
Por onde passa gente
Sem nunca se deter,
Gente que nem sequer tem tempo
De ter rosto e expressão.
Tão-pouco protestei –
Para não incomodar –
Quando me enterraram vivo.
Esperei, paciente, e a paciência
Roeu-me os ossos.
Não tem importância.
Educadamente até me pediram desculpa
Por me enterrarem vivo.
Não os odiei, não me odiavam.
Se alguma vez odiássemos,
           Talvez fossemos pessoas melhores.

Nuno Rocha Morais

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