Sabes que envelheceste,
Porque o sangue nas tuas veias
Vai irrigando também a morte.
Se assemelha à giesta, à urze.
Os seus sonhos são o tropel
De cavalos há muito mortos,
Que ficaram a dormir nas sombras
Que a infância ainda projecta;
O latir de cães companheiros de infância
E que nela ficaram, dormindo ao sol.
Um homem que envelhece
Reúne-se, em certas tardes,
Com parentes desaparecidos,
Retoma hábitos intocados,
Volta atrás em amores ressequidos
E inflecte para palavras
Que terá calado ou perdido.
Um homem que envelhece
Permite-se revisitar todas as vidas
Que poderia ter tido,
Como se divisões vazias de uma casa,
Ou melhor, como se ilhas desertas
De um arquipélago de vidas.
Um homem que envelhece
Pensa “Oxalá o meu Deus seja verdadeiro”
E tu sabes que envelheceste,
Sabes porque nunca o sangue
Te pareceu tão transitório,
Artérias que o levam,
Veias que o não trazem
Contaminado com os venenos de existir.
Sabes que envelheceste
Porque o teu corpo já não se recusa
A ser efémero: resigna-se.
A ser efémero: resigna-se.
Nuno Rocha Morais
Sem comentários:
Enviar um comentário