O que se cala por bem vai perdendo
A inocência que se possa acomodar numa espécie de silêncio.
À sua sombra cresce –
Quase se poderia dizer que cresce
À sombra do invisível, do inaudível –
Mas cresce uma ameaça que ganha corpo e se adensa.
Tudo o que se calou apodrece,
Empesta e envenena, acidula e corrompe,
Em breve os seus vermes estarão por toda a parte.
O que calaste fala continuamente
Contigo, lateja em protesto incomodo.
Poderás morrer sobre o peso residual
De tudo o que não disseste.
Tantas palavras adormecidas por conveniência
Não dormem, têm uma gravidade pestífera
Que te abraça para o fundo.
De algum modo, passaram para o outro lado do espelho,
São uma presença que acompanha
A imagem da sua própria ausência
E os lábios movem-se em formas mudas,
Obstinada recusa do teu silêncio.
Nuno Rocha Morais
Poemas dos Dias (2022)
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