quinta-feira, 9 de abril de 2020

 
Agora o pesadelo é real,
Uma agonia sem alarme.
Sentam-se em bancos de jardim,
Sofrem com os joanetes e os enfartes,
Usam de uma cortesia que parece coçada
Como os seus chapéus
E falam de guerras há muito esquecidas.
Estão em todas as fotografias
Que não foram tiradas.
Quando essas guerras acabaram
Expirado o alivio,
Tudo se tornou mais banal,
Como se o brilho da vida, à beira do abismo,
Tivesse perdido intensidade
Entre explosões, ruínas, pó,
O odor excitante de gasolina e cordite,
Esse tempo acabou e a eternidade
Está prestes a começar,
Num tédio sem bússola.
Estão a sós com a alma
Em plena sublevação.
É perigoso sentir a alma agitar-se muito,
A confundir-se com as entranhas
Procurar a superfície,
Farejar a respiração, à espreita,
À espera do sinal desde sempre combinado.
A escuridão de nenhuma voz humana.

Nuno Rocha Morais (poemas sociais)

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